sexta-feira, dezembro 30, 2005

A Pos(s)e

Sobre As Nossas Cabeças

Sobre as nossas cabeças
brilham as constelações
E as próprias mãos
se estendem
para o fogo...
Como é horrível
que as pessoas
se habituem
a fechar os olhos
e a não se espantarem
com o dia.

(Robert Rojdéstvenski, 1932-, poeta soviético)

Bom Ano 2006!

quinta-feira, dezembro 29, 2005

14 Versos do Canto I

«Os Cantos», traduzidos por José Lino Grünewald,
para a Editora Nova Fronteira,
adquirido em 1988 na Livraria Leitura, Porto.
Estava ainda longe a edição «portuguesa», como quase tudo
que aparece «novo» em Portugal.

Canto I

E pois com a nau no mar,
Assestamos a quilha contra as vagas
E frente ao mar divino içamos a vela
No mastro sobre aquela nave escura,
Levamos as ovelhas a bordo e
Nossos corpos também no pranto aflito,
E ventos vindos pela popa nos
Impeliam adiante, velas cheias,
Por artifício de Circe,
A deusa benecomata.
Assim no barco assentados
Cana do leme sacudida em vento
Então com vela tensa, pelo mar
Fomos até ao término do dia.

Boa noite!

terça-feira, dezembro 27, 2005

Nada, nem mesmo a chuva

BlockquoteNobody, not even the rain, has such small hands. e.e.cummings

Nada, nem mesmo a chuva

tem tão pequenas gotas

como as lágrimas que se movem

dentro do coração.

E as pequenas mãos

que sobem pelo rosto

das mães? Ninguém

como elas tem a chave

para tão pequenas nuvens.

Ninguém, nem mesmo o silêncio

tem tão pequenas mãos

para abrir tão fechado

domínio.

segunda-feira, dezembro 26, 2005

O Homem da Guitarra Azul

O homem dobrou-se sobre a sua guitarra,
uma espécie de ceifeiro. O dia estava verde.

Disseram, «Tens uma guitarra azul,
não tocas as coisas como elas são.»

Ele replicou, «As coisas como são
mudam-se sob uma guitarra azul».

Então disseram-lhe, « Deves tocar
uma canção para além de nós, mas que seja nós,

uma canção na guitarra azul,
das coisas exactamente como são.»

(Tradução:J.T.P)

O Tradutor

Comemoração do centenário do prof. Paulo Quintela, o Tradutor de Rilke

domingo, dezembro 25, 2005

Diálogo

O Natal é quase




















O Natal é quase a cinza
da lareira,
e no silêncio voga
o ladrar de um cão.
Sinais de cada vida
nas janelas, o Natal
é comido à roda duma mesa,
apenas as crianças
salvam o Natal,
aprendem a soletrar
a sua nova prenda.

24-12-2005

sábado, dezembro 24, 2005

A Árvore de Natal no Espaço


Uma astrofísica portuguesa, Paula Teixeira, descobriu
no seio da árvore a «maternidade» de estrelas bebés,
noticiava o Público.

Lucas, II, 6-11

The Holy Bible, Oxford, 1891

6. E aconteceu que, estando eles ali, se cumpriram os dias em que ela havia de dar à luz.
7. E deu à luz a seu filho primogénito, e envolveu-o em panos,
e deitou-o numa mangedoura, porque não havia lugar para eles na estalagem.
8. Ora, havia naquela mesma comarca pastores que estavam no campo,
e guardavam durante as vigílias da noite o seu rebanho.
9. E eis que o anjo do Senhor veio sobre eles, e a glória do Senhor os cercou de resplendor, e tiveram grande temor.
10. E o anjo lhes disse: Não temais, porque eis aqui vos trago novas de grande alegria, que será para todo o povo;
11. Pois, na cidade de Davi, vos nasceu hoje o Salvador, que é Cristo, o Senhor.

sexta-feira, dezembro 23, 2005

O Homem da Guitarra Azul

The man bent over guitar,
A shearsman of sorts. The day was green.

They said, «You have a blue guitar,
You do not play things as they are»

The man replied, «Things as they are
Are changed upon the blue guitar».

And they said then, «But play, you must,
A tune beyond us, yet ourselves,

A tune upon the blue guitar
Of things exactly as they are».

(Wallace Stevens)

quinta-feira, dezembro 22, 2005

Memórias

Com a mulher, na escada principal do antigo Aeroporto da Portela, em 1968, no dia do embarque para uma guerra colonial (Angola).

quarta-feira, dezembro 21, 2005

Memórias

Ao que vens agora,
memória,
fazer contas à vida?
Reduzir algumas rugas à beleza
do rosto que brilha ainda
por estar tão próximo do sol?
Juventude,
ao que vens agora,
intranquilizar a meia-idade?
Quisera que o tempo
fosse indeciso
e parasse
na rosa rectílinea
dos dedos cansados
de segurar a minha vida.
Ao que vens agora,
adolescência,
com essa música?
Que desafia as minhas mãos
para o corpo amado-um silêncio
que como gôndola desfila.

terça-feira, dezembro 20, 2005

Poeta em Nova Iorque


Asesinato

Cómo fue?
Una grieta en la mejilla.
Eso es todo!
Una uña que aprieta el tallo.
Un alfiler que bucea
hasta encontrar las raicillas del grito.
Y el mar deja de moverse.
Cómo, cómo fue?
Así.
Déjame! De esa manera?
Sí.
El corazón salió solo.
Ay, ay de mí!

(Federico Garcia Lorca)

domingo, dezembro 18, 2005

O eterno retorno

The Locust Tree in Flower

Among
of
green

stiff
old
bright

broken
branch
come

white
sweet
May

again.

(William Carlos Williams)

Folhas nº 11 Letras & Ofícios

O Grupo Poético de Aveiro lançou ontem , 17, o nº 11 da revista antológica de poesia e prosa «Folhas Letras & Outros Ofícios», na Biblioteca Municipal de Aveiro. Vinte são os autores que integram esta obra, predominantemente poetas: Aida Viegas,Ana Carla Amaro,Andrea Henriques,António Luís Oliveira,Aseiçaneves,Carlos Barata,Ivar Corceiro,J.T.Parreira,Jorge Pedro Ferreira,José Barreto,Maria Virgínia Monteiro,Nuno Sobral,Olinda Beja,Orlando Jorge Figueiredo,Regina,Tiónio Delmar,Gaspar Albino,José António Franco,Pedro Jordão e Zé Lu.

sábado, dezembro 17, 2005

O que disse o poeta a propósito do galo

O galo
é o alvoroço
das manhãs

O galo
é uma arquitectura

O galo
na ensonada manhã
é crista, bico
a furar o silêncio
com esporões medievais

O galo
crava as unhas
firmes no vento

O galo
indispensável
ao som obrigatório
das manhãs.


Bom fim de semana!

A Pergunta

Je te souris. Qu'est ce
qu'un sourire?
Une lumière envoyeé à
une étoile par une étoile.
Une odeur qui lie les
herbes en prairie
bourdonnante.
Une douce couleur la
couleur verte de mes
yeux s'emmêle dans tes
doigts.
Tu tiens dans ta main le
corps tout chuchotant de
la prairie.
Le contour de l'herbe
étroit et âpre raconte
mes yeux qui
regardent à l'infini.
Tu me souris.

( Halina Poswiatowska, Cracóvia, 1935-1967)

sexta-feira, dezembro 16, 2005

A poesia como um retrato

Fotografia

A solidão dele
Na cozinha,
Perto

Da janela
Um vaso de
Tulipas.

Portrait

os olhos dele
uma gaiola

onde um
pássaro

às vezes,
canta.

(Virna Teixeira )

quinta-feira, dezembro 15, 2005

Haicais



*

Vôo dos pássaros!

fio costurando ligeiro

o céu ao mar.

*

No canto da janela

nova linha do horizonte:

o fio da aranha.

(Tânia Diniz)

in www.famigerado.com #3

terça-feira, dezembro 13, 2005

Ezra Pound,traduções e originais-II

Uma Rapariga

A árvore entrou-me nas mãos,
A seiva subiu-me pelos braços,
A árvore cresceu-me no peito -
Para o chão
Crescem os ramos de mim, como braços.

Árvore és,
Musgo és,
És violetas com o vento sobre elas.
Uma criança -desta altura- és,
E tudo isto é loucura para o mundo.

(Ezra Pound)
Tradução de J.P e Carmo

N.Y

My City, my beloved, my white! Ah, slender,
Listen! Listen to me, and I will breathe into thee a soul.
Delicately upon to reed, attende me!

Now do I know that I am mad,
For here are a million people surly with traffic;
This is no maid.
Neither could I play upon a reed if I had one.

My City, my beloved,
Thou art a maid with no breasts,
Thou art slender as a silver reed.
Listen to me, attend me!
And I will breathe into thee a soul,
And thou shalt live for ever.

(Ezra Pound)

segunda-feira, dezembro 12, 2005

Ezra Pound, traduções e originais -I


A Girl

The tree has entered my hands,

The sap has ascended my arms,

The tree has grown in my breast--

Downward,

The branches grow out of me, like arms.

Tree you are,

Moss you are,

You are violets with wind above them.

A child-- so high -- you are,

And all this is folly to the world.

(Ezra Pound)

Un Pacto

Haré un pacto contigo, Walt Whitman-

Te he detestado ya bastante.

Vengo a ti como un niño crecido

Que ha tenido un papá testarudo;

Ya tengo edad de hacer amigos.

Fuiste tú el que cortaste la madera,

Ya es tiempo ahora de labrar.

Tenemos la misma savia y la misma raíz-

Haya comercio, pues, entre nosotros.

(Ezra Pound)

Continua...

domingo, dezembro 11, 2005

sábado, dezembro 10, 2005

Uma Flor na Escada

Como um boi que bate no silêncio
da aldeia, na calçada amanhecida
com seus cascos lentos
como um pássaro que fugiu da janela
uma flor como um detalhe
de Deus, rasgou a escada
aos pés dos homens, entre a pedra
e os céus, a flor humilde
aos pés dos que amaciam os degraus
como a água que respira a fonte
que corre nos mantos interiores da terra
à superfície a flor sobe
fina e débil, porém encostada ao sol
a flor desenha no ar, superior
aos pés arrastados dos homens.


Bom fim de semana!

sexta-feira, dezembro 09, 2005

2 Inéditos de Fernando Pessoa

Organizados pela prof.Manuela Parreira Silva, três volumes da poesia órtonima do Poeta vão sair sob a chancela da Assírio & Alvim. O JL, na sua edição do dia 7, fez publicar oito das duas centenas e meia de poemas inéditos. Desses, com a devida vénia, o Blog insere dois, um na língua materna do poeta, outro na sua língua de cultura, o inglês.

Fonte
Fresca e viva
A água aviva
Só de ouvida,
Minha Vida.

Sinto mais
Leves, ais
Minha dor
Quasi amor.

Fonte calma
Dou-te a alma
Dá-me a tua
Fresca e nua

Já que a aurora
A ambos doura,
Minha irmã
Na manhã.

10.-4-1912

(Poem)
A Girl, thinking of her lover, on a chair on the deck
of a liner.

Behind this chair's soft impression against my back,
Thrilled through with the sensation of my neck
Of the propeller throbbing right across my dream
Of the night when we kissed, the ship doth seem
To cross my vision of that night, the deck
Lies between our kisses' taste, a flock
Of smoke seen floating suddendly over the awning on
the deck
And the summer night far away is still there.

29-5-1915

(Fernando Pessoa)

quinta-feira, dezembro 08, 2005

O Tempo que passou

Nº 248-249, Maio 1964


Maria Sende

Havia o vento sobre as cabeças dos milhos,
havia a chuva sobre as águas dos rios
e havia a carícia de fogo do cavalo-marinho
sobre as cabeças dos homens.

E na longa noite de África
havia
almas perdidas em desejos de vida
canções serumadas de angústia
mãos duras da masturbação das facholas
e bocas aluadas
de gritos de batuque.

E nós, Maria,
homem e mulher de mãos dadas
juntos e perdidos na espiral dum sonho
sem raça!

(José Craveirinha)

terça-feira, dezembro 06, 2005

O Poema

Um poema como um gole d'água bebido no escuro.
Como um pobre animal palpitando ferido.
Como pequenina moeda de prata perdida
para sempre na floresta noturna.
Um poema sem outra angústia que a sua misteriosa
condição de poema.
Tiste.
Solitário.
Único.
Ferido de beleza mortal.

(Mário Quintana)


No Princípio

Pássaros aprendendo para sempre
a sobrevoar os rios.
E sob as árvores os pássaros
descansavam do milagre
da longa manhã azul,
sob as árvores,
dentro da sombra.




segunda-feira, dezembro 05, 2005

Anotações na margem de um Salmo

Contra os lobos defenderei a casa
de meu Pai, as suas ovelhas
contra o raio que se esconde
entre nuvens, por detrás das árvores,
as suas crias serão um só balido,
e quando o frio ranger os ossos
não lhes faltará o lume,
defenderei os pastos e as raízes
das torrentes que partem depois
num rio profundo,
defenderei a casa de meu Pai
contra o vento,
que no céu arrasta o trovão.
Não lhe faltará nunca
o apaziguamento
e as suas paredes serão tranquilas.

O Tempo que passou


Soneto Presente

Não me digam mais nada senão morro
aqui neste lugar dentro de mim
a terra de onde venho é onde moro
o lugar de que sou é estar aqui.

Não me digam mais nada senão falo
e eu não posso dizer eu estou de pé.
De pé como um poeta ou um cavalo
de pé como quem deve estar quem é.

Aqui ninguém me diz quando me vendo
a não ser os que eu amo os que eu entendo
os que podem ser tanto como eu.

Aqui ninguém me põe a pata em cima
porque é de baixo que me vem acima
a força do lugar que fôr o meu.

(J.C. Ary dos Santos)



sábado, dezembro 03, 2005

Las Religiones, de Orozco

A Mãe

Para MJP

Poucas letras sabe, as pérolas
são o filho, a filha, os netos
os bisnetos, todos
os filósofos
não são mais do que seus dedos
quando tínhamos tão frágeis
os cabelos
a sua geografia é pouca
é a beira
do sol no Alentejo
poucas letras sabe
de história, só como foi
naqueles anos dura a vida
e da arte pouco ou nada
jamais soube da orelha
cortada de Van Gogh
conhece Deus
e esse saber é o bastante
para nos trazer a vida iluminada.

sexta-feira, dezembro 02, 2005

O (nosso) Tempo que passou

«Janelas do meu quarto,(...)
Dais para o mistério de uma rua cruzada constantemente por gente,(...)
Com a morte a pôr humidade nas paredes e cabelos brancos nos homens »

(Álvaro de Campos )


Bom Fim de Semana!

O Pobre


O Cristo solitário, hamletiano?,
de Ivan Kramskoy
















"O Filho do homem não tem onde reclinar a cabeça."
Mateus,VIII,20


As aves têm o céu
no seu ninho

As raposas onde esconder
o seu olhar

Eu estou sozinho, sem pedra
onde pousar o meu sono

e onde meu corpo passa
vai minha casa.

O Tempo que passou

Poema

As palavras mais nuas
as mais tristes.
As palavras mais pobes
as que vejo
sangrando na sombra e nos meus olhos.

Que alegria elas sonham, que outro dia,
para que rostos brilham?

Procurei sempre um lugar
onde não respondessem,
onde as bocas falassem num murmúrio
quase feliz,
as palavras nuas que o silêncio veste.

Se reunissem
para uma alegria nova,
que o pequenino corpo
de miséria
respirasse o ar livre,
a multidão dos pássaros escondidos,
a densidade das folhas, o silêncio
e um céu azul e fresco.

(António Ramos Rosa)


Bom dia!


quinta-feira, dezembro 01, 2005

Sem-Abrigo


Quebra
o frio com as mãos
apertadas, um laço
que resiste
na cara da morte
Quebra
o gelo no amor
oculto entre um jardim
aperta as mãos
em cacho
fechado sobre as gretas
que restam aos dedos
sulcos
que um dia ficaram
sem trabalho.

quarta-feira, novembro 30, 2005

A Brasileira do Chiado

In the cafe A Brasileira do Chiado
sat the plural Pessoa
Fernando with laughter shaking his lips.
They waited for words to pass among them
and the noise of machines
and silence,
the silence that tasted their mouths
on the deserted wharf.

(Translation by Linda K Marshall )

in forum.poetryconnection.net

Velo, na noite em mim

VELO, na noite em mim,
Meu próprio corpo morto.
Velo, inútil absorto.
Ele tem o seu fim
Inutilmente, enfim.

(Fernando Pessoa)


Bom dia!

terça-feira, novembro 29, 2005

O Tempo que passou

Para o 70º aniversário da morte do Poeta, ocorrida a 30 de Novembro de 1935, avoco já hoje, aqui, duas obras directamente a ele ligadas, que carregam em si o peso do seu nome.

Boa noite!

Palavras d'Ouro

Procure as palavras de ouro pelo nome dos autores em:

Palavras d'Ouro

www.truca.pt/ouro.html

Na véspera do fim

Presságio

Vinham, louras, de preto
Ondeando até mim
Pelo jardim secreto
Na véspera do fim.

Nos olhos toucas tinham
Reflexos de um jardim
Que não o por onde vinham
Na véspera do fim.

Mas passam...Nunca me viram
E eu quanto sonhei afim
A essas que se partiram
Na véspera do fim.

(Fernando Pessoa)

domingo, novembro 27, 2005

Paul Klee Pintor de Poemas


Olhando uma Árvore

São invejados os pássaros
evitam
pensar no tronco e nas raízes
e satisfeitos balanceiam ágeis, todo o dia,
e cantam nas pontas dos últimos ramos.

(Paul Klee)


Por encima de las estrellas

Por encima de las estrellas
buscaré a mi Dios.
Cuando peleaba por el amor terreno
no lo buscaba.
Ahora que tengo ese amor,
he de encontrar a Dios,
que me otorgó favores
cuando estaba apartado de él.
Cómo podré conocerlo?
Sin duda ha de sonreírse de este loco,
de ahí el frescor
de las brisas en la noche de estío.
Para agradecerlo, !muda bienaventuranza
y una mirada hacia aquellas cumbres!

( Paul Klee)

sábado, novembro 26, 2005

O Anjo Exterminador


Ninguém o viu. O anjo das dez
pragas do Egipto. Era um raio
que passava a noite a limpo
as asas como gládios que cortavam
os corpos, o ar, onde passavam
nem um sorriso para o solo
árido, nem um aceno de olhos
voando rumo aos astros.
Era um anjo que ainda irrompe
nos sonhos da Terra, solitário.

sexta-feira, novembro 25, 2005

A Poesia aprisionada num tempo histórico

O teito é de pedra.
De pedra son os muros
i as tebras.
De pedra o chan
i as reixas.
As portas,
as cadeas,
o aire,
as fenestras,
as olladas,
son de pedra.
Os corazós dos homes
que ao lonxe espreitan,
feitos están
tamén
de pedra.
I eu, morrendo
nesta longa noite
de pedra.

(Celso Emilio Ferreiro )

Bom dia!

quinta-feira, novembro 24, 2005

Un Gallo

Em Il Club dei Poeti ( Il primo sito di poesia italiana contemporanea), uma amiga traduziu o meu poema O Galo, emprestando-lhe assim, experimentalmente, uma nova musicalidade. «É una poesia molto serena che non perde musicalità nella nostra lingua.»-Disse.

Un Gallo

Un gallo
cantò e un altro rispose
che stava là,
al suo posto mobile
nel vento,
ogni cosa nera
comincia a disfarsi
in luce,
la notte
passa in altre latitudini,
qualcosa comincia
a muoversi alle finestre,
le case rispondono
riprende nei cortili
la vita domestica
in una ripetizione senza tedio
né delizia,
un gallo
cominciò la routine
in tutto il suo canto
che viene
dal silenzio.

Buona Sera!

quarta-feira, novembro 23, 2005

2 Poemas de Delmore Schwartz


Poeta lendário
norte-americano (1913-1966)
esteve na origem de alguns
poemas escitos e cantados por
Lou Reed













1-This Is a Poem I Wrote at Night, Before the Dawn

This is a poem I wrote before I died and was reborn:
-After the years of the apples ripening and the eagles
soaring,
After the festival here the small flowers gleamed like the
first stars,
And the horses cantered and romped away like the
experience of skill; mastered and serene
Power, grasped and governed by reins, lightly held by
knowing hands.
(...)
It is always darkness before delight!
The long night is always the beginning of the vivid blossom of day.
(excerto)

2-En la cama desnuda, en la caverna de Platón

En la cama desnuda, en la caverna de Platón,
Luces reflejadas se deslizaban lentamente sobre la parede,
Carpinteros martillaban bajo la ventana ensombrecida,
El viento agitó las cortinas toda la noche,
Una flota de camiones extendida cuesta arriba, rechinando,
Con la carga cubierta, como siempre.
El techo se encendió una vez más, el diagrama inclinado
Se deslizó lentamente hacia delante.
Al escuchar los pasos del lechero,
Su esfuerzo en la escalera, el tintineo de las botellas,
Me levanté de la cama, encendí un cigarrillo,
Y caminé hacia la ventana. La calle empedrada
Destacaba la quietud en la que permanecen los edificios,
La vigilia de los postes de luz y la paciencia del caballo.
El capital puro del cielo del invierno
Me hizo volver a la cama con ojos exhaustos.
(excerto)


Boa tarde!

terça-feira, novembro 22, 2005

Adélia Prado -Uma Poesia Social e do Quotidiano

Casamento

Há mulheres que dizem:
Meu marido, se quiser pescar, pesque,
mas que limpe os peixes.
Eu não. A qualquer hora da noite me levanto,
ajudo a escamar, abrir, retalhar e salgar.
É tão bom, só a gente sozinhos na cozinha,
de vez em quando os cotovelos se esbarram,
ele fala coisas como «este foi difícil»
«prateou no ar dando rabanadas»
e faz o gesto com a mão.
O silêncio de quando nos vimos pela primeira vez
atravessa a cozinha como um rio profundo.
Por fim, os peixes na travessa,
vamos dormir.
Coisas prateadas espocam:
somos noivo e noiva.

(Adélia Prado )


Boa tarde!

segunda-feira, novembro 21, 2005

O Tempo que passou


A 2ª edição de
As Mãos e os Frutos
de Eugénio de Andrade
1960

Haicais

Nº 8

Nenúfares no lago:
uma mesa que Deus põe
a flutuar no vidro.

Nº9

Ver as estrelas:
quando outra vez o punho
da noite bate em nós.

A Noite Urbana

Brilham no vento as luzes vigilantes
dos candeeiros públicos,
fogueiras
para as noites húmidas,
agitam-se as cortinas
da janela que tosse,
enquanto dois vultos
se esquivam abraçados
dos últimos olhares,
entre as varandas dos prédios
há quem procure
num quarto nu a intimidade.


Bom dia!

sábado, novembro 19, 2005

A Poeta Laureada dos Estados Unidos(1993-1995)


Song

When I was young, the moon spoke in riddles
and the starts rhymed. I was a new toy
waiting for my owner to pick me up.

When I was young, I ran the day to it's knees.
There were trees to swing on, crickets for capture.

I was narrowly sweet, infinitely cruel,
tongued in honey and coddled in milk,
sunburned and silvery ans scabbed like a colt.

And the world was already old.
And I was older than I am today.

(Rita Dove)


Boa noite!

sexta-feira, novembro 18, 2005

"D'altri diluvi una colomba ascolto", (Giuseppe Ungaretti)

Como o vento uma pomba
vem voando desde o dilúvio
traz no bico
um ramo de água

Como o silêncio escuta
o mais inefável ruído
como o vento a pomba
escuta

Escuta
dos ramos o murmúrio
e a melancolia
da chamada

Uma pérola pendente
numa gota de água.


Bom dia!

quinta-feira, novembro 17, 2005

Otoños Y Otras Luces

El Otoño Se Acerca

El otoño se acerca con muy poco ruido:
apagadas cigarras, unos grillos apenas,
defienden el reducto
de un verano obstinado en perpetuarse,
cuya suntuosa cola aún brilla hacia el oeste.
Se diría que aquí no pasa nada,
pero un silencio súbito ilumina el prodigio:
ha pasado
un ángel
que se llamaba luz, o fuego, o vida.
Y lo perdimos para siempre.

ngel González )

À Próxima Festa

Só o boi e o jumento comparecem.
E os anjos em multidão
não desferem o cântico
-que é o Céu caindo na noite.

Na grande hospedaria do azul,
no mundo, ou apenas em metade
do mundo, as mangedouras
dormem vazias.

As mãos dos homens sentem
o que faz o coração, fecham
as janelas de Belém
uma vez mais sobre os ruídos,
sobre quem passa preso à Vida.

1/10/1992


Boa tarde!

quarta-feira, novembro 16, 2005

Até Amanhã

olha quem está por perto
toca quem está ao lado
de um abraço bem amigo
um carinho assim sempre é bom
até amanhã

(Tatiana Rocha, cantora e compositora brasileira)

Un Gallo

Em Il Club dei Poeti (Il primo sito di poesia italiana contemporanea), uma amiga traduziu assim o meu poema O Galo, e disse que « é una poesia molto serena che non perde musicalità nella nostra lingua», julgo até que ganha mais, enriquecendo esse simples poema:

Un gallo
cantò e un altro rispose
che stava là,
al suo posto mobile
nel vento,
ogni cosa nera
comincia a disfarsi
in luce,
la notte
passa in altre latitudini,
qualcosa comincia
a muoversi alle finestre,
le case rispondono
riprende nei cortili
la vita domestica
in una ripetizione senza tedio
né delizia,
un gallo
cominciò la routine
in tuto il suo canto
che viene
dal silenzio.


Boa noite!

Haicais

Nº 4

A pedra no lago
parte, em círculos, um Narciso
que se vê ao espelho.


Nº 5

Duas linhas correm
paralelas invisíveis:
o encontro no cais.


Nº 6

Atrás da janela
estão o pássaro e a rosa
presos ao seu corpo.

Bom dia!

terça-feira, novembro 15, 2005

Ostjuden (Judeus de Leste)


Padri nostri di questa terra,
Mercanti di molteplice ingegno,
Savi arguti dalla molta prole
Che Dio seminò per il mondo
Come nei solchi Ulisse folle il sale:
Vi ho ritrovati per ogni dove,
Molti come la rena del mare,
Voi popolo di altera cervice,
Tenace povero seme umano.

7 febbraio 1946

( Primo Levi )


Boa noite!

Lune de Miel

Ils ont vu les Pays-Bas, ils rentrent à Terre Haute;
Mais une nuit d'été, les voici à Ravenne,
A l'aise entre deux draps, chez deux centaines de punaises;
La sueur aestivale, et une forte odeur de chienne.
Ils restent sur le dos écartant les genoux
De quatre jambes molles tout gonflées de morsures.
On relève le drap pour mieux égratiner.
Moins d'une lieue d'ici est Saint Apollinaire
En Classe, basilique connue des amateurs
De chapitaux d'acanthe que tournoie le vent.

Ils vont prendre le train de huit heures
Prolonger leurs misères de Padoue à Milan
Où se trouvent la Cène, et un restaurant pas cher.
Lui pense aux pourboires, et rédige son bilan.
Ils auront vu la Suisse et traversé la France.
Et Saint Apollinaire, raide et ascétique,
Vieille usine desaffectée de Dieu, tient encore
Dans ses pierres écroulantes la forme précise de Byzance.

(T.S.Eliot)

segunda-feira, novembro 14, 2005

O Milénio

O leão não será mais rápido que o boi
em busca de pastagens
o cordeiro e o pássaro
nascerão de uma fórmula poética
e o lobo
o beijo terá na sua boca
Os jogos dos meninos
serão com as aves
uma pomba e uma águia
navegarão
em águas de branco lôdo
Um anjo passará
em forma lírica
ao mundo o seu desejo.

Os Cafés Literários Inventados...

Ler texto em www.atuleirus.weblog.com.pt, in Dos Leitores

Boa tarde!

domingo, novembro 13, 2005

sábado, novembro 12, 2005

A Grande Senhora da Poesia Palestiniana

Enough for Me

Enough for me to die on her earth
be buried in her
to melt and vanish into her soil
then sprout forth as a flower
played with by a child from my country.
Enough for me to remain
in my country's embrance
to be in her close as a handful of dust
a spring of grass
a flower.

( Fadwa Tuqan, Nablus, 1917-2003 )

sexta-feira, novembro 11, 2005

A Matéria Solar


Ao Eugénio de Andrade

Uma pedra ainda fria do silêncio
expõe-se como um corpo
de mulher, franqueia o dorso
ao sol que o Oriente lança
com a sua longa mão
cada manhã ao começarem
as linhas das casas, a copa
das árvores, os telhados
em cujo gume um gato
sacode a sua sombra.


Bom fim de semana!

XVI Bienal de Música Brasileira Contemporânea

Zoom:Hoje, dia 11, pelas 19 horas locais na Sala Cecília Meireles, do Centro de Música da FUNART, Rio de Janeiro, realizar-se-á a estreia mundial de 3 Canções do compositor e oboísta Lúcius Mota para piano e tenor. Uma dessas peças foi escrita sobre um poema de J.T.Parreira ( Kaddish por meu Filho Absalão ). No piano Marina Spodolare e tenor Marcelo Coutinho.

Consulta ao programa disponível em www.funarte.gov.br/download/ano05/bienal_mus05

quinta-feira, novembro 10, 2005

O Tempo que passou



Boa tarde!
















Novembro

A respiração de Novembro verde e fria
Incha os cedros azuis e as trepadeiras
E o vento inquieta com longínquos desastres
A folhagem cerrada das roseiras.

(Sophia de Mello Breyner )

quarta-feira, novembro 09, 2005

terça-feira, novembro 08, 2005

A Batalha Naval

Um porta-aviões americano
e uma catedral gótica
afundam-se lado a lado
em pleno Pacífico.
Até ao fim o jovem cura
toca o órgão.-
Agora aviões e anjos
pendurados no ar
não podem aterrar.

(Gunther Grass )

segunda-feira, novembro 07, 2005

Uivo


(Excerto)

Vi os melhores espíritos da minha geração destruídos pela
loucura , morrendo à fome histéricos nus,
arrastando-se de madrugada pelas ruas dos negros
à procura da droga urgente imperiosa,
tipos fixes com cabeleiras de anjo ansiando pela
antiga conexão celeste ao dínamo de estrelas na
maquinaria da noite,
que pobres e rotos e olheirentos e bêbados ficavam
a fumar na escuridão sobrenatural de
apartamentos com água fria flutuando sobre os telhados
das cidades contemplando o jazz.

(Trad. JPeC, para a D.Quixote, 1973)

domingo, novembro 06, 2005

sábado, novembro 05, 2005

Nazareth

Blockquote Jesús mozo hacía casas.
Miguel de Unamuno



Vivia numa pequena cidade
onde o limite do mundo
parava nas montanhas
Sua presença era discreta
como leve brisa que se ergue
desde a erva e sobe
até ao ar limpo das ramagens
Foi seu primeiro e não único
milagre a sabedoria
e erguer casas, como carpinteiro
foi a sua primeira alegria
Os dias passaram
deixando pó nas memórias
da infância, quem dele recordava
o seu olhar, o que dizia
sentia-se com um corpo
a saltar do chão para um rio em paz.


Bom fim de semana!

sexta-feira, novembro 04, 2005

Haicais


A palavra alcança
o coração do silêncio:
floresce o poema.

(Joanyr de Oliveira)






Homenagem a um Amigo e companheiro

Boa tarde!


quinta-feira, novembro 03, 2005

The Millennium

The lion will not be quicker than the ox
in pasture search.
The lamb and the bird
will be a poetical form,
the wolf
will have the kiss in its mouth.
The dove and the eagle
sailing
in waters of white silt.
Then an angel will make
of the Earth a lyric state.


In poetryconnection.net

EnquadrArte


Folha a folha os olhos saltam
para dentro do mundo inesperado.

Bom dia!

quarta-feira, novembro 02, 2005

O Tempo que passou

Bom dia!

Soneto nº 2 de Meditação

Uma mulher me ama. Se eu me fosse
Talvez ela sentisse o desalento
Da árvore jovem que não ouve o vento
Inconstante e fiel, tardio e doce

Na sua tarde em flor. Uma mulher
Me ama como a chama ama o silêncio
E o seu amor vitorioso vence
O desejo da morte que me quer.

Uma mulher me ama. Quando o escuro
Do crepúsculo mórbido e maduro
Me leva a face ao génio dos espelhos

E eu, moço, busco em vão meus olhos velhos
Vindos de ver a morte em mim divina:
Uma mulher me ama e me ilumina.

(Vinicius de Morais)

terça-feira, novembro 01, 2005

O Tempo que passou


Necrologia

Portugal tem nove milhões de habitantes
Lisboa talvez tenha um milhão
Nada disto me pode consolar bem sei
Morreu António Gião
Eu não o conhecia nunca o conhecerei.

(Ruy Belo )

segunda-feira, outubro 31, 2005

Martin Luther, depois das 95 Teses de 31 de Outubro

BlockquoteVotou a sua existência à luta contra a autoridade de Roma, vindo a fundar a Igreja Protestante. Os seus escritos polémicos, as colecções de poesia religiosa e sobretudo a tradução da Bíblia que publicou entre 1522 e 1534, são factores decisivos para uma unidade da língua alemã. In «Oito Séculos de Poesia Alemã», Olívio Caeiro, Fundação Calouste Gulbenkian, 1983

«Eine fest burg ist unser Gott,

Eine gute wehr und waffen,

Er hilft uns frey aus aller not,

die uns jtzt hat betroffen.»

Castelo forte é nosso Deus,

espada e bom escudo;

Com seu poder defende os seus

Em todo o transe agudo.

In Cantor Cristão, Juerp, RIO, 1971

O Tempo que passou


Despojos

Desertaram palavras dum sentido
e a boca automática fechou-se.
Desistiram os olhos da paisagem
e a memória apagou-se.

As mãos abandonaram os esforços.
Indefiniu-se a alma de desejos.
Ficaram lábios frios e destroços
do corpo. Só despojos.

(José Augusto Seabra)


A terra

A terra
na guerra
é nossa
-do povo.

Na paz
a terra
é vossa.
E o povo?

Na terra jaz,
nas grades
do ovo-

sem guerra,
nem paz
nem renovo.

( Casimiro de Brito)

*
Bom dia!

domingo, outubro 30, 2005

O Testemunho do Génesis

Toda a beleza do Éden é o que existe
no homem.
Impossível dizer outra coisa
da vida.
De toda a beleza do Éden
o que existe é o homem.
Entre o descanso e os relógios,
quando a luz compõe aqui
e além a nitidez da manhã,
entre um pássaro que apanha o voo
e a confusão universal.
Mesmo quando no sono
tem um sonho leve,
de todo o Éden é o esplêndido
homem que embeleza a morte.

*

Bom dia!

sábado, outubro 29, 2005

O Tempo que passou


Poema

Súbitos mergulhadores descendo nas águas inimigas
Com os olhos fitos e os peitos esmagados,
Descendo devagar, ao som lento de segundos vertiginosos
como séculos,
Todos nós vos acompanhamos e juntamos todas as nos-
sas forças na mesma meditação.
Aqui, da terra firme,
Entre nuvens e terra,
Entre o suor e o orvalho,
Esperamos o termo com todas as nossas forças.
E sabereis a nossa mensagem:
Só há saída pelo fundo.

( Cristovam Pavia )