sexta-feira, novembro 30, 2007

O Hóspede

Os díscipulos de Emaús, de Caravaggio

Depois da noite se instalar
ao redor do fogo, abrir
sobre a cama um espaço
para o corpo se atirar
e lençóis que ainda trazem
os perfumes da manhã
alguém chega, entrou
pela noite com olhos indecisos
e sonhos de distância
traz sono e estremece
à mais pequena folha
que cai na noite fresca
esse alguém onde o vedes
pode trazer um coração
lavado, uma metáfora
dissonante, molhos
de palavras, e partindo
o pão, abrir os nossos olhos.
15/10/2007

quinta-feira, novembro 29, 2007

Viola, de José Craveirinha

No coração dos homens
a vida ficou um grande hectare de terra fresca de chuva
o sol dando um sentido às largas folhas das árvores
e brunindo
seios duros e inquietos ao pilar do milho

Era o feitiço dos dedos
em sonhos de compasso e esquecimento,
o mundo saindo das latas de castanha de caju
nas densas cordas da viola de Tingane.

Passos soltos na tarde maravilhosa de domingo
Tingane, rua e viola
ritmo...
ritmo...
ritmo invencível de coisa nova!

quarta-feira, novembro 28, 2007

terça-feira, novembro 27, 2007

Do meu amigo poeta Brissos Lino

UMA NUVEM EM TRÓIA

Hoje há maçãs húmidas
na nossa praça

já não chove
e há caracóis resolutos
em cada pedaço de erva

a Arrábida molhada
seca agora
aberta ao sol.

Paira ainda uma nuvem solitária
sobre a península
a projectar sombra no rio

nuvem esquecida
envergonhada
no tecto limpo
de Tróia.

quinta-feira, novembro 22, 2007

e.e.cummings transliterado

um riso sem um
rosto(um olhar
sem um eu)
cuida

do(não to
que)ou
desaparec
erá semru

ído(na doce
terra)&
ninguém
(inclusive nós

mesmos)
relem
brará
(por uma fra

ção de
um mo
mento) onde
o que como

quando
por que qual
quem
(ou qualquer coisa)

(Trad. de Augusto de Campos)

quarta-feira, novembro 21, 2007

Poema para o amor

Vieram fazer ninho. Nos teus braços
acenava uma janela
por isso vieram fazer ninho.
O primeiro pássaro, pesando no ar
como a luz do outono
depois o segundo com os olhos de azul
como se a fevereiro não restasse
outra cor senão a luz.
Vieram a gosto, para refrescar a solidão
que é uma taça de cristal
de silêncios
são os filhos que vieram
fazer ninho
na alegria mais alta do teu rosto.

sábado, novembro 17, 2007

"Trozo de Piel", poemas de Pablo Picasso


Gritos de meninos gritos de mulheres gritos de
pássaros gritos de flores gritos de madeiras e
de pedras gritos de ladrilhos gritos de
móveis de camas de cadeiras de cortinas de
caçarolas de gatos e de papéis gritos de aromas
que se arranham gritos de fumo…

(15-18 de Junho de 1937)

(Trad. de JTParreira)


A escrita poética de Picasso não foi alheia aos conflitos (Guerra Civil de Espanha e II Guerra Mundial) marcada pelo medo e pelas ameaças que desvalorizaram o homem perante os animais.
Na figuração e dissociação dos elementos que formaram Guernica, a chacina e destruição da cidade sagrada dos Bascos, por exemplo. E uma amostra disso é este texto do livro de poemas, Trozo de Piel, marcado por um pendor expressionista.

#
Bom fim de semana.

sexta-feira, novembro 16, 2007

Miguel Torga, evocação do Centenário

Associando-se à evocação do Centenário do nascimento do poeta, o Grupo Poético de Aveiro promove um recital de poesia no dia 23 de Novembro, sexta-feira, pelas 21h45m, na Biblioteca Municipal de Aveiro.
Além de diversas leituras, a cargo de vários elementos do Grupo, do evento fará parte uma comunicação: Miguel Torga pelo Prof. Doutor António Manuel Ferreira, docente da Universidade de Aveiro.

segunda-feira, novembro 12, 2007

Rua Carvalho Araújo-Revisitada



Stand in the dark light in the dark street
Gregory Corso


Como um obelisco escuro de pé
na luz da rua às sombras encostado
procuro entrar na memória
de uma janela, vivi ali?
Soltava os meus olhos de cinco anos
para a rua em baixo
outra gente que anda lá não suspeita
de nada
como um mundo novo que foi para mim
aquele quarto.

8-11-2007

sábado, novembro 10, 2007

Revisitações


Poeta norte-americano, Gregory Corso (1930-2001)

Casa onde nasci

Fico de pé na luz escurecida da rua escura
olho para a minha janela, nasci ali.
Há luzes acesas, por lá outra gente move-se.
De gabardina, acendo a boca num cigarro,
um olho sob o chapéu, a mão engatilhada.
Atravesso a rua e entro no edifício.
As latas do lixo não escondem o mau cheiro.
Subo ao primeiro andar; Orelhas Sujas
dirige-me a navalha…
Eu apalpo-lhe todos os relógios furtados.

(Trad.J.T.Parreira)


Birthplace Revisited
(from Gasoline)

I stand in the dark light in the dark street
and look up at my window, I was born there.
The lights are on; other people are moving about.
I am with raincoat; cigarette in mouth,
hat over eye, hand on gat.
I cross the street and enter the building.
The garbage cans haven't stopped smelling.
I walk up the first flight; Dirty Ears
aims a knife at me...
I pump him full of lost watches.

(Gregory Corso)

quarta-feira, novembro 07, 2007

Alba



Alba

As cool as the pale wet leaves
of lily-of-the-valley
She lay beside me in the dawn.

(Ezra Pound)


Alba

Tão fresca como as pálidas folhas molhadas
do lírio dos vales
Estendeu-se ao meu lado na aurora.

(Trad.J.T.P)

sábado, novembro 03, 2007

A árvore de Mondrian




No dia em que a árvore de Piet Mondrian
ficou do tamanho vermelho
dos seus ramos
o vento
emaranhado nos ramos tranquilos
Mondrian nos mostrou
o interior do nada.

(At day when the Piet Mondrian’s tree
was of the red size of the branches
the wind
entangled in the calm branches
Mondrian shows to us
the interior of nothing.
)

In Literary Kicks and The Literature Network

sexta-feira, novembro 02, 2007

A 5ª frase ("venham mais cinco")

A Linha de Cabotagem (http://www.linhadecabotagem.blogspot.com) passou-me este desafio e a Helena Monteiro é credora de Arte e de Literatura:

As regras:
1.Pegue no livro mais próximo; 2.Abra na página 161 e procure a 5ª frase completa; 3.Transcreva-a na íntegra para o seu blogue; 4.Passe o desafio a mais cinco bloggers.

"Tal vez suponga el lector que ya es hora de que aparezca en el horizonte otra Montaña Deleitosa."

in "La Habitación Enorme", de e.e.cummings, pág.161, Espasa Galpe, 2004

Estava a trabalhar na tradução de um poema de cummings e tinha a meu lado este livro autobiográfico do poeta norte-americano.

www.romadevidro.blogspot.com
www.aluzdovoo.blogspot.com
reading-writing.myblog.it
www.ana-maria-costa.blogspot.com
www.atmo-sphera.blogspot.com

quinta-feira, novembro 01, 2007

Poema xiii


a máquina de escrever de e.e.cummings



platão disse

lhe: ele não podia
crer nisso(jesus

disse-lhe; também
não quis
crer)lao

tsé
certamente disse
lhe, e o general
(sim,

madame)
sherman;
e ainda
(acredite
ou

não) tu
disseste-lhe: eu disse
lhe; nós dissemos-lhe
(ele não acreditou, não

senhor) levou
com um bocado japonês
do antigo viaduto

da avenida
6ª; no topo da sua testa: para

ele crêr

Trad.J.T.Parreira