Se na poesia contemporânea portuguesa há dois poetas distintos no seu discurso poético e na sua poiética (o modo de construir seus poemas), são, sem dúvida, José Gomes Ferreira e António Ramos Rosa.
Aquele trabalhava a metáfora lírica, grande parte dos poemas inserindo-se mesmo no que poderíamos dizer proximidade do surrealismo, mesmo nos seus poemas cujos referentes eram Memórias, «Na infância da janela do primeiro andar/ aquela rapariga de corcel nos cabelos» ou «O sol corria/ nos bibes do vento»;
Ramos Rosa, por seu turno, está integralmente dedicado à poesia pura, e não encontro melhor exemplo do que o conteúdo do seu livro “Ocupação do Espaço”, e o das suas mais recentes obras. Poeta da linguagem, talvez o Saussure ou o Roman Jakobson das relações entre linguística poética e a ciência dos homens, uma antropologia no poema: «Oiço os murmúrios do sol. Saboreio o que sou.» ou «tenho o coração confundido e a rua é estreita», «soletro velhas palavras generosas» «Não posso adiar o amor para outro século»
É interessante pois notar um pequeno poema de ARR cujos referentes são dois: Abril e o próprio Ferreira, o autor de Memória das Palavras. O gosto de falar de um poeta, fazendo-o crescer por detrás do sol, evocando-o profeticamente, sem a prisão cristalina e rochosa da Sibila (que não tem lugar na Poesia), como “homem de Abril”.
O mês de Abril sempre surgiu nos poetas com a força das suas próprias raízes, que despontam, ancestrais. Desde Chaucer ( When April with his showers sweet with fruit) a Withman, até ao definitivo “Abril é o mais cruel dos meses, gerando / Lilases na terra morta).