Your face, the
gaze you
returned -
words in your
eyes, mirrors.
Where did we
stop
last time
I saw you.
(Virna Teixeira)
Teu rosto, o
olhar que você
retornou -
palavras nos teus
olhos, espelhos.
Onde nós
paramos
a última vez
que te vi.
(Trad. J.T.Parreira)
A Poesia é o assunto do Poema - Wallace Stevens . Este Blog não respeita o Acordo Ortográfico.
segunda-feira, março 31, 2008
sexta-feira, março 28, 2008
A Saída
Tout s'éteignit
Le jour, la lumière interieure
René Char
Tudo se apaga
as janelas, os espelhos interiores
depois os silêncios
são varridos, gestos lentos
no tempo repetido
na sala o dia apaga-se
Fogos da alma interior
apagam-se, paixões
cadeiras, mesas regressam
à sua solidão, a sala
não respira senão a humidade
que fica nas janelas.
26-3-2008
Le jour, la lumière interieure
René Char
Tudo se apaga
as janelas, os espelhos interiores
depois os silêncios
são varridos, gestos lentos
no tempo repetido
na sala o dia apaga-se
Fogos da alma interior
apagam-se, paixões
cadeiras, mesas regressam
à sua solidão, a sala
não respira senão a humidade
que fica nas janelas.
26-3-2008
quinta-feira, março 27, 2008
O Tempo que passou
quarta-feira, março 26, 2008
Duna ( Inédito)
A mão escorrega no cetim e alisa
A pele, a paz, o sono, o sopro
De espuma os dedos molha e enxuga
Na pele o cetim da mão no sono
Sopro na espuma ao de leve – e espalha
Espuma que desliza na minha paz.
(Clélia Mendes)
A pele, a paz, o sono, o sopro
De espuma os dedos molha e enxuga
Na pele o cetim da mão no sono
Sopro na espuma ao de leve – e espalha
Espuma que desliza na minha paz.
(Clélia Mendes)
segunda-feira, março 24, 2008
Luis Gaspar, re+dizer:
053 - J.T. Parreira e Jorge Sousa Braga
Neste programa, voltamos, a pedido, às lendas de povos antigos e recordamos palavras de ouro de dois poetas: J.T. Parreira e Jorge Sousa Braga.A música que acompanha a lenda é, como sempre, de Luís Pedro Fonseca e a que ilustra a poesia do “magnatune.com”
Standard Podcast [21:51m]: Hide Player Download
Neste programa, voltamos, a pedido, às lendas de povos antigos e recordamos palavras de ouro de dois poetas: J.T. Parreira e Jorge Sousa Braga.A música que acompanha a lenda é, como sempre, de Luís Pedro Fonseca e a que ilustra a poesia do “magnatune.com”
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sábado, março 22, 2008
Os Andaimes das Ruínas
Joyce, James. Ulysses. Paris: Shakespeare and Co., 1922. Quarto, original blue-green wrappers. Custom half-leather box. $60,000. First edition, one of 750 printed on handmade paper (out of a total edition of 1000).
Esta ideia de um renascimento não nos pareceu de todo despicienda. Em um dos três livros raros de poesia de James Joyce, Pomes Penyeach, podemos achar mesmo que estamos a ser devolvidos ao conteúdo de Ulysses.
Designadamente no poema «O Santo Ofício», iconoclasta, anticlerical, irritado contra o catolicismo romano, o qual é, como toda a obra joyceana, uma purga e ao mesmo tempo uma farsa crítica da Irlanda, contra todas as instituições, e uma sátira a W.B.Yeats e a outros intelectuais da sua geração.
Esse poema traz-nos um texto metalinguístico e satírico, construído sobre referências literárias, usadas ad hominem mais do que em louvor, havendo até quem não resista a comparar o seu dizer com as frases de Quevedo, ou recordando outros escritores medievais pela sua irreverência, designadamente contra as indulgências que «tiravam» as almas do Purgatório.
O escritor irlandês, o James Joyce ortónimo, e o Stephen Dédalus protagonista e alter-ego, construiu entre andaimes o romance que faz regressar o moderno Ulisses. Esse romance é «uma ruína magnífica», como escreveu depois um historiador literário, Walter Allen (O Romance Inglês, Pelicano) . Mas que não dispensou andaimes, sendo esta a palavra que é usada por Ezra Pound para significar toda a estrutura do célebre romance joyceano.
Lendo (aqueles que conseguem fazê-lo!), paciente e longamente, o livro, entender-se-á necessariamente o sentido daquela substantivação de Pound . Mais do que uma obra sobre as ruínas de um dia na vida de Leopold Bloom, estruturada entre andaimes, o que temos são as ruínas do próprio Ulisses, a figura patronímica e tutelar do romance.
As figuras arquetípicas do ancestral Homero, passaram para o moderno Joyce. Da mítica Odisseia passaram para o Odisseu. O mesmo é dizer que passaram do universal para o particular. Do arquétipo mais longínquo para a experiência consolidada de um dia como o 16 de Junho de 1904.
Da arquiescrita anterior, que em Homero consolida a língua, para um jogo de linguagem que em James Joyce já apontava para descodificar um mito.
De um modelo cosmogónico para uns quantos personagens que não deixam de estar, como comuns pessoas urbanas, na crítica à vida do início do passado século XX. Em duas simples palavras, do padrão para a cópia recriadora com os elementos da vida moderna.
Em relação à obra do aedo cego, Homero, pai da Odisseia, o século passado teve no romance de Joyce, Ulisses, a sua explanação concentrada, uma década em um dia de 18 horas.
O princípio:
Ó Musa, fala-me do solerte varão, que, depois, de ter destruído a cidade sagrada de Tróia, andou errante por muitas terras(...), e por sobre o mar.
A viagem de Bloom, o Ulisses de Joyce, teve um início menos acidentado:
Leopold Bloom comia com gosto os órgãos internos de quadrúpedes e aves.(...) Mais do que tudo gostava de rins de carneiro grelhados... (...) -Vou dar um pulo na esquina. De volta num minuto. E depois de ouvir a própria voz acrescentou: -Quer alguma coisa para agora?
Mesmo que uma pessoa não seja leitora assídua do Ulisses, é sabido que Leopld Bloom saiu no dia 16 de Junho a fim de ir ao talho comprar um rim. O célebre esquema de Gilbert ( que interpreta paralelamente as situações da Odisseia e do Ulisses), refere que «Leopold Bloom has breakfast before saying goodbye to his wife Molloy, still in bed.»
De um modelo cosmogónico para uns quantos personagens que não deixam de estar, como comuns pessoas urbanas, na crítica à vida do início do passado século XX. Em duas simples palavras, do padrão para a cópia recriadora com os elementos da vida moderna.
Em relação à obra do aedo cego, Homero, pai da Odisseia, o século passado teve no romance de Joyce, Ulisses, a sua explanação concentrada, uma década em um dia de 18 horas.
O princípio:
Ó Musa, fala-me do solerte varão, que, depois, de ter destruído a cidade sagrada de Tróia, andou errante por muitas terras(...), e por sobre o mar.
A viagem de Bloom, o Ulisses de Joyce, teve um início menos acidentado:
Leopold Bloom comia com gosto os órgãos internos de quadrúpedes e aves.(...) Mais do que tudo gostava de rins de carneiro grelhados... (...) -Vou dar um pulo na esquina. De volta num minuto. E depois de ouvir a própria voz acrescentou: -Quer alguma coisa para agora?
Mesmo que uma pessoa não seja leitora assídua do Ulisses, é sabido que Leopld Bloom saiu no dia 16 de Junho a fim de ir ao talho comprar um rim. O célebre esquema de Gilbert ( que interpreta paralelamente as situações da Odisseia e do Ulisses), refere que «Leopold Bloom has breakfast before saying goodbye to his wife Molloy, still in bed.»
Na comparação esquemática elaborada pelo designado «The Gilbert Schema», seguindo a ordem disposta no próprio romance, na II parte da Odisseia, temos a ninfa Calypso e Leopld Bloom. A relação de ambos é oposta. Enquanto na obra clássica de Homero, Calypso, filha de Atlas, guarda languidamente Odisseu em cativeiro durante város anos, Leopold Bloom, a personagem central de Joyce, mantém com sua mulher uma situação de submissão servil, quase invertebrada, levando-lhe à cama o pequeno-almoço, antes de sair.
E nesse dia, que mais tarde se chamou o Bloomsday, disse adeus à sua mulher Molly, que continuava deitada às 8 horas da manhã.
No final da jornada diária, no Ulysses, Leopold entra em casa regenerado, os acontecimentos fizeram-no renascer. Embora a sua «Ithaca», a residência no 7 Eccles Street aonde retorna, continue a ser a rotina e a sua «Penélope» tenha dificuldade em ser uma esposa fiel, não resistindo aos amantes.
Ao contrário, na Odisseia homérica, a esposa de Odisseu resiste aos seus pretendentes, que ao longo dos dez anos de ausência do marido a tentam requestar.
No final da jornada diária, no Ulysses, Leopold entra em casa regenerado, os acontecimentos fizeram-no renascer. Embora a sua «Ithaca», a residência no 7 Eccles Street aonde retorna, continue a ser a rotina e a sua «Penélope» tenha dificuldade em ser uma esposa fiel, não resistindo aos amantes.
Ao contrário, na Odisseia homérica, a esposa de Odisseu resiste aos seus pretendentes, que ao longo dos dez anos de ausência do marido a tentam requestar.
Esta ideia de um renascimento não nos pareceu de todo despicienda. Em um dos três livros raros de poesia de James Joyce, Pomes Penyeach, podemos achar mesmo que estamos a ser devolvidos ao conteúdo de Ulysses.
Designadamente no poema «O Santo Ofício», iconoclasta, anticlerical, irritado contra o catolicismo romano, o qual é, como toda a obra joyceana, uma purga e ao mesmo tempo uma farsa crítica da Irlanda, contra todas as instituições, e uma sátira a W.B.Yeats e a outros intelectuais da sua geração.
Esse poema traz-nos um texto metalinguístico e satírico, construído sobre referências literárias, usadas ad hominem mais do que em louvor, havendo até quem não resista a comparar o seu dizer com as frases de Quevedo, ou recordando outros escritores medievais pela sua irreverência, designadamente contra as indulgências que «tiravam» as almas do Purgatório.
Alguns versos, finalmente, como prova:
«Para entrar no céu, viajar no inferno,\ ser piedoso ou terrível,\ uma pessoa precisa positivamente do alívio\ das indulgências plenárias.»
sexta-feira, março 21, 2008
A pedra a tapar a evidência
Uma pedra a tapar
a evidência, apenas uma pedra
bloco uníssono
de silêncio
Feia, indomada
a pedra a fechar a morte
perante a qual
toda a dúvida se acaba
E no entanto nada há
mais simples
do que a pedra, símbolo
do que queda irresolúvel
Uma pedra branca, granito
não mármore, nem
impossível esmeralda
a pedra a tapar a evidência
Pedra desviada pela música
toque de rosa ou
da imensa Mão celeste
Então a pedra abre-se
ao interior da morte
de onde ao sol passou
o Princípe da Vida.
a evidência, apenas uma pedra
bloco uníssono
de silêncio
Feia, indomada
a pedra a fechar a morte
perante a qual
toda a dúvida se acaba
E no entanto nada há
mais simples
do que a pedra, símbolo
do que queda irresolúvel
Uma pedra branca, granito
não mármore, nem
impossível esmeralda
a pedra a tapar a evidência
Pedra desviada pela música
toque de rosa ou
da imensa Mão celeste
Então a pedra abre-se
ao interior da morte
de onde ao sol passou
o Princípe da Vida.
quinta-feira, março 20, 2008
Dia Mundial da Poesia, 21
Integrado nas Comemorações do Dia Mundial da Poesia, o Grupo Poético de Aveiro irá realizar um recital de poesia na Biblioteca Municipal de Ílhavo no dia 21 de Março pelas 21h30m.
Tema: A poesia de José Régio
Organização: Confraria Camoniana de Ílhavo
GRUPO POÉTICO DE AVEIRO
domingo, março 16, 2008
The Red Wheelbarrow
sábado, março 15, 2008
Despejos
COHRE.ORG
Para onde vamos agora, sem um vaso...
Ralph Ellison
Atirados para a rua
como tralha miúda
no passeio
utensílios domésticos, móveis
que deixaram um espaço
um buraco negro no tempo
Um monte de haveres
e sem coragem para os escalar
uma gaveta que demorou anos a encher
espalha as raízes
de uma vida, uma moldura
oval com sorrisos.
Cadeiras sem outro orgulho
senão o de ficarem de pé
entre as chamas, um fogão
de esmalte, uma mesa
que descansa em quatro pernas
uma cama, um espelho atónito
todos perdidos, entre estranha gente.
7-3-2008
Para onde vamos agora, sem um vaso...
Ralph Ellison
Atirados para a rua
como tralha miúda
no passeio
utensílios domésticos, móveis
que deixaram um espaço
um buraco negro no tempo
Um monte de haveres
e sem coragem para os escalar
uma gaveta que demorou anos a encher
espalha as raízes
de uma vida, uma moldura
oval com sorrisos.
Cadeiras sem outro orgulho
senão o de ficarem de pé
entre as chamas, um fogão
de esmalte, uma mesa
que descansa em quatro pernas
uma cama, um espelho atónito
todos perdidos, entre estranha gente.
7-3-2008
terça-feira, março 11, 2008
Um Epitáfio
segunda-feira, março 10, 2008
Ulisses entrando em Ítaca
sábado, março 08, 2008
Dia 8 de Março no Mundo
Luis García Montero:
"Nadie besa dos veces / a la misma mujer"
('Mi futuro y Heráclito') in Vista cansada, Madrid, Visor, 2008
"Nadie besa dos veces / a la misma mujer"
('Mi futuro y Heráclito') in Vista cansada, Madrid, Visor, 2008
Quando um poeta escreve:
A última carta, mas se não voltar a escrever
é porque já me arrumei por dentro.
Ler aqui do meu amigo Brissos Lino
é porque já me arrumei por dentro.
Ler aqui do meu amigo Brissos Lino
sexta-feira, março 07, 2008
O assalto
Deixaram um pássaro morto
insustentável no ar
morto, na casa devassada
o silêncio que no pássaro
se aninha
O que levaram foi o ouro
dinheiro algumas joías
de família alguns jarrões
da China que pareciam
com a sombra deslizar
à mesma hora sobre os móveis
Era a moradia mais a jeito
com persianas
atrás das quais havia tempo
e não havia nenhuns olhos.
1-2-2008
insustentável no ar
morto, na casa devassada
o silêncio que no pássaro
se aninha
O que levaram foi o ouro
dinheiro algumas joías
de família alguns jarrões
da China que pareciam
com a sombra deslizar
à mesma hora sobre os móveis
Era a moradia mais a jeito
com persianas
atrás das quais havia tempo
e não havia nenhuns olhos.
1-2-2008
quinta-feira, março 06, 2008
quarta-feira, março 05, 2008
Papel de Rascunho
papel de rascunho » 2007 » November
... latas do lixo não escondem o mau cheiro. Subo ao primeiro andar; Orelhas sujas dirige-me a navalha… Eu apalpo-lhe todos os relógios furtados. GREGORY CORSO. Tradução: J.T.Parreira
... latas do lixo não escondem o mau cheiro. Subo ao primeiro andar; Orelhas sujas dirige-me a navalha… Eu apalpo-lhe todos os relógios furtados. GREGORY CORSO. Tradução: J.T.Parreira
terça-feira, março 04, 2008
Mevsimsiz-Forum (Poesia traduzida para o turco)
Autores portugueses traduzidos por Vehbi Tasar
BIRAK ZAMAN YAPSIN GERİSİNİ/ Ana Paula İnacia
BOĞULAN SEVGİLİ/ Luís Vaz de Camões
BÜTÜN AŞK MEKTUPLARI GÜLÜNÇTÜR/ Fernando Pessoa
DİP NOT/ Jorge de Sena
KENDİ PSİKOGRAFI/ Fernando Pessao
KOYUN BAKICISI XXXIX/ Fernando Pessoa
STAYNVEY & OĞULLARI/ Joao Tomaz Parreira
ŞOPEN: BİR ENVANTER/ Jorge de Sena
UNUTMA BENI/ Rui Coias
YAZIN EN SON GÜNÜ/ José Tolentino Mendonça
BIRAK ZAMAN YAPSIN GERİSİNİ/ Ana Paula İnacia
BOĞULAN SEVGİLİ/ Luís Vaz de Camões
BÜTÜN AŞK MEKTUPLARI GÜLÜNÇTÜR/ Fernando Pessoa
DİP NOT/ Jorge de Sena
KENDİ PSİKOGRAFI/ Fernando Pessao
KOYUN BAKICISI XXXIX/ Fernando Pessoa
STAYNVEY & OĞULLARI/ Joao Tomaz Parreira
ŞOPEN: BİR ENVANTER/ Jorge de Sena
UNUTMA BENI/ Rui Coias
YAZIN EN SON GÜNÜ/ José Tolentino Mendonça
O Tempo que passou
segunda-feira, março 03, 2008
João Cabral de Melo Neto - A Paisagem Zero na Escrita Poética
Letras :
João Cabral de Melo Neto (1920-1999), poeta do Brasil e diplomata, figura representativa e polémica - sempre indisposto contra coisas do seu tempo e da literatura - da Geração de 45, foi, sem dúvida, na quase totalidade da sua obra poética, um desconstrutor de paisagens.
João Cabral de Melo Neto (1920-1999), poeta do Brasil e diplomata, figura representativa e polémica - sempre indisposto contra coisas do seu tempo e da literatura - da Geração de 45, foi, sem dúvida, na quase totalidade da sua obra poética, um desconstrutor de paisagens.
Depois do conhecidíssimo poema “Morte e Vida Severina” e dos cemitérios nordestinos reduziu a paisagem brasileira, social e humana, ao grau zero da existência.
Ele próprio afirmou, pouco antes de morrer, num canal de televisão brasileiro, em entrevista concedida já às escuras - estava quase cego - que fazia poesia com linguagem irónica, sem pena ou lágrimas, que iriam favorecer os cruéis.
Com efeito, J C M N assumiu o compromisso poético social com os excluídos, os deserdados do tecido sócio-económico brasileiro, aqueles homens, mulheres e crianças do Nordeste que sofreram a seca e deram azo a que se escrevesse sobre a geopolítica da fome. Desequilibrou - embora a ideia fosse ao contrário da sua Geração de 45 - os excessos literários do Modernismo brasileiro, enriquecendo no entanto o processo criador juntamente com outro grande poeta social, o autor de Rosa do Povo, Carlos Drummond de Andrade.
Nesta linha de procurar fazer os leitores reflectirem sobre as paisagens da morte, com rostos humanos sofredores - só com um paralelo em algumas grandes telas de Portinari -, criou com certeza inimizades literárias, rarefez o ar social de Pernambuco ao descrever, recriando pela desconstrução do símbolo, da imagem e do referente, os cemitérios nordestinos, por exemplo, neste poema em que ironiza com a morte :
“ Nenhum dos mortos daqui / vem vestido de caixão. / Portanto, eles não se enterram, / são derramados no chão.”
E causou obviamente polémicas, por vezes derivadas da sua tendência para a teorização, mal aceita pelos seus companheiros da Geração de 45, segundo os quais Melo Neto “era um teórico de formação anémica”. Em certo momento, as reacções foram de tal forma deselegantes que, na Revista de Poesia e Crítica, nº 7, de 1981, um dos articulistas afirmou “melhor mesmo é deixar Cabral com o seu realejo de repetir Severinos, ovos de galinha, engenhos, engenhos, ovos de galinha, Severinos.”
Sem dúvida que a grande poesia de ´João Cabral de Melo Neto é formada da repetição até à descontrutividade de um certo Brasil humano que foi tão dramático nos anos 40-60, o dos retirantes em que só o suor não secou, como agora são dramáticas também as realidades das Favelas, dos meninos da rua, dos massacres da Candelária. As paisagens, geofísicas e sociais, reduzidas a zero, pela visão do poeta autor de O Engenheiro, estão, de facto, patentes nos seus versos maiores, como o já referido Morte e Vida…, mas não apenas. Também surgem com enorme força em poemas do livro generalista Educação pela Pedra, ou em poemas dos livros que obedecem ao mesmo compromisso social, como Dois Parlamentos ou O Cão sem Plumas. Exactamente porque a plasticidade dos poemas de Melo Neto é toda nordestina, é a descrição de uma “paisagem zero”, que é no dizer do poeta a terra varrida de defuntos.
domingo, março 02, 2008
Aniversário em Manhattan
Abril 1999
A poucas horas
para os 52,
a sair para a rua que treme
no chão, com sinais de fumo
para o futuro,
com uma esquina que dobra
os pés para a Lexington Avenue,
52 anos cheios
e atrás de mim uma história.
Adiante o futuro e os meus olhos
que vão atrás dos óculos e nuvens
indo e vindo entre o oceano
e Albany.
A poucas horas
para os 52,
a sair para a rua que treme
no chão, com sinais de fumo
para o futuro,
com uma esquina que dobra
os pés para a Lexington Avenue,
52 anos cheios
e atrás de mim uma história.
Adiante o futuro e os meus olhos
que vão atrás dos óculos e nuvens
indo e vindo entre o oceano
e Albany.
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