Vai para o emprego às oito
dentro de um perfume e do corpo
do vestido com o cheiro do café
Todos os dias
a boca do fogão
conhece o mesmo lume
Senta-se na frescura da manhã .
que entra pelas janelas do transporte
Conduz o sangue e a adrenalina
que começam como uma força
no trânsito, sempre o mesmo
o emprego e alguns sonhos.
28/9/2009
Nota crítica in bbde.org:
"Como de costume, belo e certeiro nas palavras escolhidas. Em poucas frases resume cirurgicamente o que significa a repetição dos mesmos gestos todos os dias, ao acordar."
A Poesia é o assunto do Poema - Wallace Stevens . Este Blog não respeita o Acordo Ortográfico.
terça-feira, setembro 29, 2009
domingo, setembro 27, 2009
Diálogo sobre a Guerra Civil espanhola
Cartaz de Valencia, 1936
SOY UN CRISTIANO BUENO
A pedra ferida supõe o massacre
brutal
a morte corneou milhares
com as baionetas
da “cara al sol”
aqueceu o sangue nas multidões
como na faena
agora há um generalíssimo em posição
de espanto
na estranheza do inferno:
“Soy un Cristiano bueno, así
por qué estoy sufriendo tanto,
Señor?”
25/9/2009
(Brissos Lino)
COMO BURACOS NA HISTÓRIA
Como buracos na História
(Brissos Lino)
A luz do dia cresce nos buracos
nasce do mármore
a memória dos velhos
A família ali gastou-se e agora
do passado reunida, na parede
que ficou
atrás da vida
A morte rendilhou a pedra
e todo o silêncio de Espanha
detonou ali.
24/9/2009
SOY UN CRISTIANO BUENO
A pedra ferida supõe o massacre
brutal
a morte corneou milhares
com as baionetas
da “cara al sol”
aqueceu o sangue nas multidões
como na faena
agora há um generalíssimo em posição
de espanto
na estranheza do inferno:
“Soy un Cristiano bueno, así
por qué estoy sufriendo tanto,
Señor?”
25/9/2009
(Brissos Lino)
COMO BURACOS NA HISTÓRIA
Como buracos na História
(Brissos Lino)
A luz do dia cresce nos buracos
nasce do mármore
a memória dos velhos
A família ali gastou-se e agora
do passado reunida, na parede
que ficou
atrás da vida
A morte rendilhou a pedra
e todo o silêncio de Espanha
detonou ali.
24/9/2009
sexta-feira, setembro 25, 2009
Correio
vem do trabalho às sete
na caixa do correio
as mãos cheirando a rosas
e o pensamento molhado de mensagens
recolhe contas
comunicados bancários e alguns volantes
publicitários
(Adelaide Amorim, Rio de Janeiro)
Via Verso&Prosa
na caixa do correio
as mãos cheirando a rosas
e o pensamento molhado de mensagens
recolhe contas
comunicados bancários e alguns volantes
publicitários
(Adelaide Amorim, Rio de Janeiro)
Via Verso&Prosa
quinta-feira, setembro 24, 2009
Los Fusilados
O poeta Brissos Lino em Barcelona, junto à parede da Igreja de Santa Maria del Pi, onde o catolicíssimo Franco assassinou republicanos.
PEDRA DILACERADA
O som ríspido dos tiros martela ainda
o esquecimento
na pequena praça catalã
a chuva das décadas lavou
o sangue dos rojos
fuzilados
e as consciências
mas a parede da igreja de Santa Maria del Pi
guardou as feridas
até hoje
como buracos na História
a pedra dilacerada não se recompôs
ainda
nem a memória
dos homens.
Palmela, Janeiro de 2008
(© Brissos Lino)
PEDRA DILACERADA
O som ríspido dos tiros martela ainda
o esquecimento
na pequena praça catalã
a chuva das décadas lavou
o sangue dos rojos
fuzilados
e as consciências
mas a parede da igreja de Santa Maria del Pi
guardou as feridas
até hoje
como buracos na História
a pedra dilacerada não se recompôs
ainda
nem a memória
dos homens.
Palmela, Janeiro de 2008
(© Brissos Lino)
segunda-feira, setembro 21, 2009
Desfile de Haute Couture
sábado, setembro 19, 2009
O Prado
Para ver Las Meninas dobramos
as esquinas, atravessamos os séculos
e o silêncio pendurado
nas paredes do museu do Prado.
Cruzamo-nos com olhos
e os corpos que vão obedientes
atrás dos pensamentos,
cruzamos quadros com os nossos olhos
como Abraão sem nenhuma aritmética
diante das estrelas,
estamos nus sob o frio de mármore
do museu do Prado.
O nosso coração dá o alarme,
todos os quadros estão ali, e confiamos
voltar atrás nos séculos
do que foi o hemisfério norte.
Nunca entrámos numa tumba
Onde tanto esplende a morte.
as esquinas, atravessamos os séculos
e o silêncio pendurado
nas paredes do museu do Prado.
Cruzamo-nos com olhos
e os corpos que vão obedientes
atrás dos pensamentos,
cruzamos quadros com os nossos olhos
como Abraão sem nenhuma aritmética
diante das estrelas,
estamos nus sob o frio de mármore
do museu do Prado.
O nosso coração dá o alarme,
todos os quadros estão ali, e confiamos
voltar atrás nos séculos
do que foi o hemisfério norte.
Nunca entrámos numa tumba
Onde tanto esplende a morte.
terça-feira, setembro 15, 2009
A espera de Bukowski
segunda-feira, setembro 14, 2009
Poética
Comentário sobre o poema "Casa na costa"
(Rui Miguel Duarte)
Tranquilidade demorada, apenas a casa, o nevoeiro e o oceano. Lugar de resguardo e continência, de balanços, e ao mesmo tempo de desejo de se expressar, daí o grito. As gaivotas sopradas são prosopopeia feliz. Na passiva, sem agente de passiva, parece implícita a presença do vento, em ausência. Pois pode ser o vento a fazer ou desfazer névoas. Ou o "eu" que se converte em agente desse fazer e desfazer. Fica como que a "pictura", que é o que é dado ver. As gaivotas, ao elevarem-se e voltearem no ar (vão no vento), para quem olha da casa, ou de outra perspectiva, parecem sopradas.
(Rui Miguel Duarte)
sábado, setembro 12, 2009
O regresso dos restos de Jorge de Sena
«Uma vez eu, chegando a Portugal
após muitos anos de ausência minha»
Toda a gente está feliz pelo «regresso de um dos grandes homens de cultura do século XX».
Jorge de Sena regressou, mas já não pode dizer isso em poema, como o fez, datando os versos de 21/4/74. Agora regressou para tornar feliz a consciência de alguns hipócritas, mais felizes do que ele porque ainda estão vivos.
«...O povo, como pode
sobrevive, entre futebol e emigração. O resto
lê, com esperança, com raiva, ou com desânimo,
o livro do general que, silencioso, não comenta
dos jovens centuriões que se precipitaram.»
A minha geração e aqueles com mais de 40 anos entendem estes versos, na sua prosopopeia poética.
Também a referência a dois aspectos cruciais da história contemporânea no poema (*)
Ou este aviso, muito significativo com data de 4/6/74, «Liberdade, liberdade, / tem cuidado que te matam».
(*)
o livro 'Portugal e o Futuro', do Gen. António de Spínola e o Golpe das Caldas, de 16/3/74
quinta-feira, setembro 10, 2009
terça-feira, setembro 08, 2009
Casa na costa
Numa casa em frente do mar
a fazer
e a desfazer névoas
Com gaivotas
sopradas desde as rochas
Uma casa com um quintal
debruçado para o coração
do oceano
onde um grito, que saia
pela noite, um grito
repercuta
todos os silêncios
que guardei
Pouca coisa poria numa casa assim
defronte do mar
para fazer
e desfazer os lentos
nevoeiros.
5/9/2009
a fazer
e a desfazer névoas
Com gaivotas
sopradas desde as rochas
Uma casa com um quintal
debruçado para o coração
do oceano
onde um grito, que saia
pela noite, um grito
repercuta
todos os silêncios
que guardei
Pouca coisa poria numa casa assim
defronte do mar
para fazer
e desfazer os lentos
nevoeiros.
5/9/2009
segunda-feira, setembro 07, 2009
Ritos
Nicanor Parra, Chile, 1914-
Sempre que regresso
Ao meu país
Depois de uma viagem longa
A primeira coisa a fazer
É perguntar pelos que morreram:
Todo o homem é um herói
Pelo facto simples de morrer
E os heróis são nossos mestres.
E em segundo lugar
Pelos feridos.
Só depois
Não antes de cumprir
Este pequeno rito funerário
Considero-me com direito à vida:
Fecho os olhos para ver melhor
E canto com rancores
Uma canção do início de século.
Trad. J.T.Parreira
Sempre que regresso
Ao meu país
Depois de uma viagem longa
A primeira coisa a fazer
É perguntar pelos que morreram:
Todo o homem é um herói
Pelo facto simples de morrer
E os heróis são nossos mestres.
E em segundo lugar
Pelos feridos.
Só depois
Não antes de cumprir
Este pequeno rito funerário
Considero-me com direito à vida:
Fecho os olhos para ver melhor
E canto com rancores
Uma canção do início de século.
Trad. J.T.Parreira
sábado, setembro 05, 2009
Nicanor Parra, quase um século
Conheci Nicanor Parra em 1976 e quando procurava estruturar minha poesia nas várias poiéticas e aprender, li «nós conversamos / na linguagem de todos os dias /não cremos em signos cabalísticos».
Em 2009, enclausurado em sua casa em Valparaíso, Chile, mas ainda activo na sua poesia neo-simbolista desde 1967, até aí cultivando os seus anti-poemas desde a década de 30, Nicanor Parra faz hoje 95 anos.
No início da década de 70 tomou chá na Casa Branca, a convite da mulher de Richard Nixon - a esquerda rompeu com ele.
Um dos maiores poetas da literatura hispânica, segundo o crítico Harold Bloom é um dos melhores poetas do Ocidente. Este qualificativo tomará forma em Março próximo, quando o criador da anti-poesia for homenageado no V Congreso Internacional de la Lengua Española , que se vai celebrar justamente em Valparaíso.
Amanhã, tentaremos a tradução de um poema seu, Ritos.
sexta-feira, setembro 04, 2009
Proletariado
O pai é um homem revoltado
Quando chega a casa apanhamos
sempre os cacos do partido
que tem razões que Marx desconhece
O pai é um homem
centrado nos mapas
das revoluções
Está perdido
como as cores que caem
dos retratos de Guevara .
22/8/2009
Publicado como inédito em A Ovelha Perdida e transcrito em Samucablog
Quando chega a casa apanhamos
sempre os cacos do partido
que tem razões que Marx desconhece
O pai é um homem
centrado nos mapas
das revoluções
Está perdido
como as cores que caem
dos retratos de Guevara .
22/8/2009
Publicado como inédito em A Ovelha Perdida e transcrito em Samucablog
quarta-feira, setembro 02, 2009
Cidade, poema de Ángel Gonzaléz
Brilham as coisas. Os telhados crescem
Sobre as copas das árvores.
Prestes a partirem-se, tensas,
As ruas elásticas.
Aí estás tu: sob o emaranhado
De cabos metálicos,
Nos quais coalha o sol como um nimbo
que completa a tua imagem.
Andorinhas rápidas ameaçam
Fachadas impassíveis. As vidraças
Transmitem luminosas e secretas
Mensagens.
Tudo são gestos breves, invisíveis
Para os olhos rotineiros.
E de repente, não estás. Adeus, amor, adeus.
Partiste.
Nada fica de ti. A cidade circula:
Moinho em que tudo se desfaz.
(Trad. J.T.Parreira)
Sobre as copas das árvores.
Prestes a partirem-se, tensas,
As ruas elásticas.
Aí estás tu: sob o emaranhado
De cabos metálicos,
Nos quais coalha o sol como um nimbo
que completa a tua imagem.
Andorinhas rápidas ameaçam
Fachadas impassíveis. As vidraças
Transmitem luminosas e secretas
Mensagens.
Tudo são gestos breves, invisíveis
Para os olhos rotineiros.
E de repente, não estás. Adeus, amor, adeus.
Partiste.
Nada fica de ti. A cidade circula:
Moinho em que tudo se desfaz.
(Trad. J.T.Parreira)
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